Supremacia Humana
Estamos vivendo essa pandemia de corona virus por um único motivo:
Porque o ser humano, em sua percepção de supremacia sobre os animais, entende que matar e comer animais é um direito e uma escolha pessoal. Em alguns países as pessoas comem vacas, galinhas, porcos, peixes, patos e carneiros. Em outros, come-se cachorros e gatos, morcegos e cobras. Quais animais são protegidos e tratados como de estimação, e quais são explorados e mortos é algo definido pela cultura.
Há quem olhe com horror para vacas sendo mortas e transformadas em hambúrgueres e cintos de couro – e há também quem sinta o estômago revirar com o pensamento de um cachorrinho inocente virando o mesmo prato que a vaca vira, sem se dar conta de que essa percepção é uma construção cultural e que transformar qualquer animal em hamburger, seja a vaca ou o cachorro, envolve necessariamente um processo industrial ou informal de criação, confinamento e abate, durante o qual o animal sente medo, dor e sofrimento.
Mas respeitamos essas “escolhas pessoais”, não é mesmo? Ninguém quer tirar do chinês o direito de comer uma lula viva e se movimentando, porque o preço de nos horrorizarmos e nos opormos a essa escolha é termos que olhar para as nossas próprias e tratá-las com o mesmo escrutínio. É a razão pela qual sentimos dissonância cognitiva quando olhamos de frente para o fato de a nossa cultura prever punição em lei para crueldade contra animais domésticos, ao mesmo tempo em que chama de jantar outro animal que vive confinado, explorado, abusado e, finalmente, é morto. Legalmente.
Pois bem… enquanto as vítimas dessas ditas escolhas pessoais são animais não humanos, seguimos vivendo, trabalhando, criando filhos, nos divertindo e pagando contas. De olhos fechados para o que a exploração, abate e consumo de animais ao redor do mundo causa ao nosso planeta, aos próprios animais e até mesmo à nossa saúde. Eis que, não mais que de repente, uma dessas escolhas pessoais desencadeia um processo de pandemia que começa a fazer vítimas humanas.
E aí?
Era de se esperar que, neste momento, a população mundial abrisse os olhos para a realidade que essas “escolhas pessoais” desencadeia. Mas não… A força do condicionamento sócio cultural fala mais alto, nos mantém cegos e conversamos com amigos sobre a excentricidade da escolha daquele animal específico, enquanto comemos um bife, a carne frita de outro animal, ao molho mostarda. Completamente alheios à realidade de que o problema não é comer animais que nos parecem exóticos. É comer animais. Ponto. Não concorda? Vamos adiante…
As mais assustadoras epidemias dos últimos tempos resultaram dessas escolhas, que sustentam a indústria de exploração animal, seja para o consumo de carne, ovos ou leite e derivados. Ebola, gripe suína, SARS, HIV… todas chegaram a nós por causa da existência de uma demanda por produtos de origem animal, que por sua vez dá origem a criações e indústrias, onde o contato com estes vírus fica altamente facilitado. Ainda que estes vírus não cheguem a nós, necessariamente e sempre, pelo consumo direto de carnes (embora possa acontecer), é a demanda desse nosso consumo que cria as condições mais propícias para que humanos entrem em contato com eles. COVID-19 não é a excecão. COVID-19 é o mesmo erro, repetido… até quando?
Generalizando uma fala popular, todos aceitamos que o “o seu direito termina onde começa o meu”. Temos leis que formalizam essa idéia. Você tem o direito de beber álcool, ele é legalizado. Mas se beber, decidir dirigir bêbado e matar uma pessoa no processo, vai preso. É crime. É a consequência de uma escolha pessoal irresponsável que esbarrou catastroficamente no direito de vida do outro. Como sociedade, usamos o critério de arestas de direitos alheios para definir o que é escolha pessoal que se respeita ou se pune. Por que? Porque entendemos que se não houvesse contratos sociais embasados em empatia, viveríamos em barbárie anárquica. Porque quando uma escolha pessoal gera como consequência a perda da vida de outra pessoa, entendemos que anuência social a isso é perigosa e concordamos em punir escolhas pessoais irresponsáveis ou cruéis. De repente, algumas escolhas pessoais não são assim só suas, nem tão isoladas, porque interferem no direito à vida do outro.
E comer carne, é escolha pessoal?
A escolha pessoal de comer animais “exóticos” em mercados chineses gera a demanda que coloca esses animais à venda. A consequência disso, atualmente, chama-se Corona Vírus e está fazendo vítimas humanas no mundo inteiro, criando caos econômico, nos forçando ao isolamento social, ameaçando a vida de grupos inteiros de pessoas, gerando pânico, tirando as crianças das escolas, afetando nossa saúde mental e estilo de vida. Tomou conta da nossa vida de todos os ângulos que se olhe.
Aí todo mundo para, assustado, sem muita opção de fazer de conta que não está acontecendo. Todos querendo proteger a vida humana. A própria e a dos outros, porque se os outros forem todos sendo infectados, é questão de tempo até que nós próprios também sejamos. Todo mundo para, porque é a vida humana que está em jogo.
Mas já que estamos todos meio parados, falando sobre isso – e, praticamente, só sobre isso – talvez seja a hora de aproveitarmos o tempo para refletir sobre essas “escolhas pessoais” que temos feito e pedindo para serem respeitadas, toda vez que um vegano defende o veganismo e discute com você que comer ou não comer carne não é uma escolha pessoal – e você, indignado, conclui que vegano na certa tem um parafuso a menos, é excêntrico, extremista e não respeita os seus direitos. “Se você não quer comer carne, não coma, mas não venha querer me impor a sua preferência alimentar”. Na verdade, veganos que expressam suas convicções são pessoas que querem que você entenda que a sua escolha pessoal tem consequências para todos – e também produz vítimas. Atualmente, essas vítimas são também humanas. As vítimas animais estão no seu prato todos os dias.
Vejo pessoas nervosas, assustadas e desorientadas com a necessidade do afastamento social e enclausuramento. Ironicamente, a massiva maioria dos animais que você consome vive assim a vida toda, sem que esse enclausuramento sirva de alivio com o pensamento de que isso possa lhes aumentar a probabilidade de sobrevivência. Mas nisso, ninguém fala. Porque pimenta nos olhos do outro é refresco. Quanto está ardendo essa pimenta no seu olho agora?
Porém, igualmente importante, é que a humanidade se dê conta da dinâmica da qual ativamente participa ao colocar animais no prato: a geração de demanda para uma indústria que nos deixa doentes, seja por epidemias, pandemias ou doencas crônicas que nos adoecem a longo prazo.
A responsabilidade dessa pandemia é de todos nós. E a responsabilidade de fazer diferente também. Este é o momento de parada para reflexão sobre como, individualmente, podemos optar por escolhas pessoais mais empáticas, gentis, éticas e responsáveis com os animais, com o nosso planeta, com a humanidade como um todo. Quando o direito individual de comer animais coloca em risco vidas humanas, economias mundiais e as gerações vivas que precederam as nossas e merecem nossa reverência e respeito, precisamos nos perguntar se manter essas escolhas encorajadas pela cultura e por essas indústrias faz algum sentido. Se realmente nosso desejo baseado em paladar justifica o risco que se desenrola hoje bem à frente dos nossos olhos. E, se não justificar, o que você está disposto a fazer para mudar isso? Qual a postura individual com caráter de responsabilidade social cabe a você? E a partir de quando você está disposto a ter essa postura? E, se não agora, quando?
Porque se você lavar as mãos (literal e simbolicamente), usar o álcool gel, evitar sair de casa e fritar um bife no jantar, você em muito ajuda, mas não se engane: você ainda é parte do problema. Hoje foi um animal em um mercado chinês. Amanhã pode ser a costelinha de porco que você comprou para o churrasco. A gripe suína não nos deixa mentir sobre isso. A nossa insistência em manter hábitos culturais, como feijoadas com linguiça, churrascos de domingo, perus de Natal, bacalhoadas de páscoa, Mc Donald’s com as crianças e carne com batata no jantar não é ecologicamente sustentável, é potencialmente perigosa à vida humana e cobra seu preço.
Então, fica apenas a pergunta: qual preço você prefere pagar? Abrir mão de preferências de paladar e tradições sócio culturais ou a recorrência de epidemias e pandemias com a pletora de consequências que vêm com elas? A escolha, hoje, ainda é sua. E ela é pessoal. Mas a consequência dela é de todos nós. Pense bem, reflita, e se quiser fazer parte da solução, para ajudar a evitar pandemias futuras, aqui estão alguns links para se informar melhor:
A hipocrisia Natalina: https://youtu.be/fpnIEewBrkc
A realidade sobre os ovos: https://youtu.be/1Y17043N6zI
Dominion (documentário): https://youtu.be/PZO04lrg0rs
Coronavirus e o consumo de animais: https://youtu.be/gnQL-brI-9I (em inglês)
Você nunca olhará a sua vida da mesma forma de novo: https://youtu.be/Z3u7hXpOm58 (em inglês)
Sociedade Vegetariana Brasileira: https://www.svb.org.br/
Portal Vista-se: https://www.vista-se.com.br/
Somos carnívoros. Será? https://youtu.be/o_-8VVPev80
Gary Yourofsky, O melhor discurso: https://youtu.be/es6U00LMmC4 (em inglês)